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segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Deus Salve a Rainha: Elizabeth II no Brasil

Vamos lembrar os 60 anos de reinado de Elizabeth II da Inglaterra e nada melhor do que resgatarmos a visita da mesma ao Brasil ocorrida há quase quarenta e quatro anos. Era o dia 5 de novembro de 1968, "o ano que não terminou" como diz o título da conhecida obra de Zuenir Ventura. Mas parecia que a visita da rainha Elizabeth II da Inglaterra também não terminava mais. Foram dez dias visitando o Brasil e passando por várias cidades como Recife, Salvador, Rio de Janeiro, Brasília e São Paulo (com um "pulo" em Campinas). Algo impensável para os padrões atuais de visitas de chefes de Estado.
A vinda da rainha ocorreu em um momento complicado da nossa história. Os estudantes agitavam as ruas contra o Governo Militar e o seu então representante maior: o marechal-presidente Artur da Costa e Silva. Ainda havia uma relativa liberdade de informação, como mostra a cobertura feita pelas revistas da época sobre a solene e atrapalhada visita da rainha. As tensões políticas estavam levando o país para o Ato Institucional número 5 (AI-5), baixado em dezembro daquele ano e que cancelou o pouco que restava de liberdade de imprensa. Era a "ditadura escancarada" assinalada pelo jornalista Élio Gaspari. A visita foi um pequeno respiro para o que viria depois que a rainha deixasse o solo tupiniquim de volta ao palácio de Buckingham em Londres.




Por outro lado, não faltaram as gafes diante de tão expressiva personalidade. Ao brindar o aniversário da rainha, o cerimonial esqueceu de lembrar o nosso presidente que o "happy birthday" já tinha ocorrido (21 de abril e não no dia 5 de novembro). Ao tentar pronunciar o "Deus salve a rainha" em inglês, Costa e Silva se enrolou e ficou no "God...God...the Queen". Na visita da rainha a Campinas (isso mesmo, ela esteve lá...) um cavalo "puro-sangue" ficou tão "excitado" diante de Sua Majestade que teve de ser acalmado às pressas com éter. Um outro incidente envolveu o empresário José Tjurs, dono do Hotel Nacional de Brasília, onde a soberana ficou hospedada, que sem permissão da segurança, simplesmente invadiu o elevador onde estava a rainha e soltou: "A senhora sabe por que está hospedada no meu hotel? É porque eu sou o Onassis brasileiro" (na época, o armador grego Aristóteles Onassis era tido como uma das maiores fortunas do mundo, uma espécie de Bill Gates dos dias de hoje). Tudo isso sem contar a nossa primeira-dama Iolanda Costa e Silva que chamou o princípe Philip de "pão" e os intérpretes que o acompanhavam não conseguiam encontrar uma tradução precisa para esse termo na nobre língua anglo-saxônica. Na recepção em Brasília feita no Palácio dos Arcos foram convidadas 2300 pessoas e compareceram 7 mil.




Em São Paulo a rainha foi convidada para a inauguração da nova sede do Museu de Arte de São Paulo, na avenida Paulista (onde o museu está atualmente) e desfilou em carro aberto pelo centro da cidade (na foto acima, da Revista O Cruzeiro de 23.11.1968). Fico imaginando se esse roteiro seria feito nos dias de hoje, a rainha passando pelo cruzamento da avenida Ipiranga com a São João, contornando a atual cracolândia e atravessando o viaduto do Chá. O centro de São Paulo ainda não tinha sido abandonado pelas elites e nem pela classe média, que depois fugiram para os Jardins e para os condomínios fechados.




A visita ao Terraço Itália foi simbólica ao mostrar como a cidade de São Paulo ainda podia exibir um belo cartão postal. Na foto acima, a rainha acompanhada pelo então prefeito Faria Lima e pelo governador Abreu Sodré, observa o eixo formado pela avenida São João. O prédio maior que aparece no segundo plano, um pouco à esquerda, é o edifício Andrauss, que foi atingido por um grande incêndio em 1972.
Contudo, a que devemos tão agradável visita? Ah, no início de 1969 seria realizada em São Paulo a Feira Britânica, onde a indústria inglesa iria apresentar máquinas de empacotar chicletes, equipamentos para os setores de engenharia civil e naval, máquinas para a agricultura, indústria têxtil, energia elétrica e a atração maior, o Hovercraft, um veículo capaz de andar sobre qualquer superfície.  Mais de 700 empresários ingleses viriam para a feira, considerada a maior exposição inglesa feita no mundo naquela época. Enfim, os ingleses estavam a fim de "business" com o Governo Militar brasileiro.
E as críticas à falta de liberdade de expressão e às torturas que já começavam a ocorrer no Brasil??? Hoje quando um chefe de Estado visita o Irã ou Cuba, a primeira coisa que perguntam é se durante a visita, o tema dos direitos humanos e das liberdades democráticas serão abordados. Na visita da rainha Elizabeth e do príncipe consorte Philip, tais temas nem passaram perto da agenda.
Deus salve a rainha...

Fontes consultadas:

Revista O Cruzeiro, edição de 23.11.1968 (de onde foi extraida a foto do brinde à rainha pelo presidente).
Revista Veja, edição de 13.11.1968.
Agência Estado (foto da rainha no Terraço Itália).

3 comentários:

  1. Que história mirabolante! amei ! visitei o Terraço Itália em 2008 , muito lindo,
    eu digo que foi a aventura mais arretada que vivi em São Paulo.

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    1. Sim Bernadete, é uma vista deslumbrante da cidade. Obrigado por seu comentário e um grande abraço!

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    2. Sim Bernadete, é uma vista deslumbrante da cidade. Obrigado por seu comentário e um grande abraço!

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